A Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP-NOVA) integra grupo multidisciplinar de especialistas que desenhou estudo serológico nacional para obter estimativas de prevalência da Covid-19 e determinar a fiabilidade dos números em Portugal. O objetivo? Combater a pandemia de forma exemplar.
Dinamizado pelo Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC), e com a colaboração do Instituto Nacional de Estatística (INE), o roteiro foi desenhado em conjunto com especialistas do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS), do Instituto de Saúde Baseada na Evidência da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, da NOVA SBE, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (Ciências ULisboa), e do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, da Universidade do Porto, entre outros.
A definição precisa da forma de obter estimativas de prevalência da doença Covid-19 vai determinar a fiabilidade dos números bem como o êxito da resposta à pandemia. Grupo multidisciplinar de cientistas reconhece esta necessidade premente e propõe uma estratégia concertada para a realização de um estudo serológico assente em duas vertentes: uma linha nacional (com crescente escala, intensidade e granularidade) e outra local ou sectorial, implementada em três fases e com o possível envolvimento de autarquias e estruturas regionais/locais de saúde. A proposta defende uma articulação robusta entre entidades públicas e outros parceiros, garantindo que os resultados obtidos irão colocar Portugal numa posição exemplar na resposta à pandemia.
Dado o grande número de assintomáticos nesta doença, testar para a presença de anticorpos contra o SARS-CoV-2 é crucial para conhecer o real impacto da doença e diversas entidades têm-se desdobrado na realização de estudos parciais sobre frações da população. No entanto, casos de êxito, implementados noutros países europeus, demonstram que apenas uma ação nacional concertada e estruturada, “com base numa amostra aleatória (em particular evitando recorrer a amostras de conveniência, potencialmente enviesadas), poderá dar a conhecer a real prevalência da infeção e representar uma fonte de informação fundamental no combate à pandemia” afirma Pedro Magalhães, do Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa.
A urgência desta realidade motivou o encontro de especialistas de renome para definir um roteiro rigoroso e aberto a todas as Instituições públicas ou privadas que estejam interessadas na realização de estudos serológicos.
O roteiro proposto inicia-se com uma primeira fotografia do impacto da doença através de um estudo-piloto nacional, com uma amostra representativa da população, ainda antes de uma potencial segunda vaga (obter a precisão desejada das estimativas de prevalência a nível nacional aponta para que seja necessária uma amostra aleatória de 5000 testados).“Os testes serológicos são um instrumento poderoso para identificar a dispersão e intensidade de transmissão que o vírus atingiu numa primeira vaga da epidemia e poder definir as medidas futuras a implementar” afirma Carlos Penha-Gonçalves, coordenador do grupo de trabalho e investigador do Instituto Gulbenkian de Ciência. O inquérito nacional de sero-prevalência da Covid-19 proposto neste roteiro incluiria a realização de “um questionário e a colheita de uma amostra de sangue aos participantes e a subsequente realização de testes serológicos para permitir conhecer se a pessoa teve contato e resposta ao vírus mas, também, estimar quantos desses tiveram sintomas ou foram assintomáticos”, refere André Peralta dos Santos da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa.
Determinado o primeiro grupo, importa acompanhá-lo, como população sentinela, a partir da qual se propõe a condução de um estudo longitudinal que permita monitorizar periodicamente as ondas da epidemia ao longo do tempo. “Avaliar regularmente a taxa de seroconversão, ou seja, a quantidade de pessoas com anticorpos contra este coronavírus, é um importante indicador epidemiológico na gestão a médio-longo prazo da epidemia e no ajustamento das medidas de mitigação” realça Pedro Pita Barros da NOVA SBE. Pode-se agora recorrer a testes serológicos de alta fiabilidade desenvolvidos e validados por uma outra iniciativa de cooperação interinstitucional, o consórcio Serology4COVID, coordenado pelo Instituto Gulbenkian de Ciência e que envolve mais quatro institutos biomédicos da área de Lisboa e Oeiras – iMM, CEDOC, ITQB NOVA e iBET.
Numa terceira fase, e após obtenção da estimativa fiável da prevalência da infeção em território nacional, os peritos propõem a realização de um estudo mais vasto com maior granularidade regional e com poder estatístico para gerar estimativas de sero-prevalência com grande precisão. “O INE tem conhecimento e experiências únicos para apoiar no desenho, e eventualmente implementação, desta amostra, com as mesmas características do estudo-base, mas com estratificações e níveis de precisão aumentados, determinados após análise dos resultados do estudo-base e longitudinal, estimando-se uma amostra entre 25 000 a 30 000 indivíduos”.
Com a definição dos parâmetros necessários para condução de um estudo nacional, o grupo de peritos preconiza a colaboração com outros estudos parcelares de igual rigor, a serem promovidos por municípios ou organizações da sociedade civil, promovendo assim a articulação harmoniosa entre diversos estudos rigorosos, que será de grande utilidade para complementar a linha de trabalho nacional. Estes estudos podem focar a sua atenção em áreas específicas da população ou setoriais, entre os quais profissionais de saúde, autoridades de segurança pública e profissionais de lares de idosos.
O estudo nacional proposto, e a sua implementação, “é um instrumento decisivo para que Portugal se destaque como um exemplo de rigor na adoção de medidas de vigilância epidemiológica focadas na proteção da população, servindo de exemplo para outros países. É excecional e muito motivador termos cientistas deste calibre em Portugal e é uma grande oportunidade utilizarmos o seu conhecimento e disponibilidade”, afirma Carlos Penha-Gonçalves, concluindo que a “estratégia de base científica está concluída e pronta para ser implementada por entidades públicas e/ou privadas”.
Consulte o Roteiro Serológico Nacional.